Técnica de formulação de recursos

 

Celsius 61    Técnica de formulação de recursos

Este texto surgiu da necessidade dos estagiários e estagiárias da UERJ, e de cursos de hipnose que ministrei, ao longo do tempo (desde 1988), de terem um material que os orientasse de uma forma mais objetiva na formulação dos recursos que os clientes necessitam ter para enfrentarem seus traumas ou outros problemas.

Resiliência-no-trabalho
Às vezes tem que tomar remédio também junto com a psicoterapia, tudo depende de um excelente diagnóstico diferencial junto ao cliente.

Recordo ao iniciante que tanto os conceitos de flexibilidade e de resiliência devem ser bem estudados, ou seja, refletir sobre a flexibilidade implica em compreender a enorme diferença entre rigor e rigidez. E a compreensão de que a flexibilidade é uma condição fundamental para a existência da resiliência é outro item sobre o qual um psicoterapeuta deve meditar, refletir, profundamente. A maestria em qualquer área é fruto de um enorme labor,  de um verdadeiro laboratório conforme dizem os artistas quando estudam um personagem para interpretar em suas oficinas de teatro.  Desta maneira, este passo a passo que se segue não deve ser interpretado como um guia linear pois a psicoterapia se realiza na interação com o cliente, ou com os clientes (casais, grupos e família).

Venho-de-tantas-tempestades-que-perdi-o-meu-medo-da-chuva

Logo, este é um texto de apoio que requer a supervisão de um psicoterapeuta experiente. Faz tempo, relato de meu amigo Manoel, funcionário do SPA, houve um episódio que pode ilustrar o que aqui se declara… Uma aluna entrou apavorada na secretaria pois o cliente estava “quebrando tudo”. Manoel, ali sozinho e sem conhecimento de psicologia, mas com determinação foi até a sala de atendimento e lá chegando viu o sujeito de cabeça baixa, imóvel. Manoel viu que a sala estava com várias coisas quebradas, agora sem aspas, não era apenas o relato de uma jovem com medo, de fato o homem, de estatura baixa, porém forte, havia depredado cadeiras e jogado alguns objetos ao chão. Manoel perguntou firme para ele, olho no olho, o que se passava? O homem ainda transtornado disse que “ela quis invadir a minha privacidade”. Manoel retrucou: “Ué, o senhor não veio aqui para falar de sua intimidade?”… O relato de meu amigo segue, mas basta esta passagem para se ilustrar a importância de se refletir sobre se saber “como” fazer uma abordagem segura, o que se deve evitar, como agir em determinadas situações.

arqueiro

O fato do SPA da UERJ não ter até hoje, uma campainha de emergência nas salas de atendimento (peço isto desde 1988), da segurança ser precária ou inexistente, de haver toda uma estrutura na UERJ que peca e falha em vários sentidos, por exemplo, se houver um incêndio também não há um sistema eficaz de aviso para alertar as pessoas… Estamos falando de um prédio de 12 andares com muitas escadas de incêndio onde se acumula lixo, muito papel e plásticos e onde a estrutura física da escada permite que o fogo se alastre para cima e para baixo rapidamente, através dos vãos abertos nas laterais… Estamos falando das escadas de incêndio, isto é, que deveriam servir para as pessoas se evadirem… Portanto, voltando ao exemplo, fica claro que uma boa aprendizagem técnica se faz necessária para se evitar certos “atropelos” na sintaxe do cliente. Digamos, apenas para ilustrar que o cliente tivesse determinados componentes sexuais mal resolvidos e a estagiária, querendo ajudar e acelerar a condução da sessão para chegar a esta ajuda, tivesse ameaçado, com perguntas, as defesas psíquicas do cliente…. Bum!!! Algo aconteceu ali, certamente. Logo, se faz mister haver um bom preparo sobre a formulação de recursos. O próprio relacionamento com o cliente já forma um elo de confiança.

UERJ

ESTUDANTES DA UERJ SOFREM COM FALTA DE COLETA DE LIXO.

LIXO SE ACUMULA NO ESTACIONAMENTO DA UERJ POR FALTA DE PAGAMENTO.

 

lixo uerj

É de suma importância esta compreensão que a formulação do recurso se dá de uma forma “natural”, na empatia, no rapport, e usando técnicas de “pacing”, “leading” e “backtrackframe”… E metáforas, e humor, e padrões de linguagem verbal e não verbal. Qualquer psicoterapeuta experiente perceberá a limitação do passo a passo fornecido abaixo, por isto ele serve aos neófitos, aos aprendizes, e talvez, tenha serventia nos trabalhos de supervisão.

lixo salas

Resiliência é possuir energia para enfrentar crises, traumas, perdas, graves adversidades, transformações na vida (traições, separações), rupturas e desafios, elaborando as situações e recuperando-se para seguir em frente.

O termo é usado há mais de 30 anos pela psicologia, porém o conceito ganhou popularidade depois do ataque terrorista ao World Trade Center, nos EUA, em 11 de setembro de 2001.

Após a tragédia, o governo distribuiu cartilhas às pessoas envolvidas com o acidente para ensiná-las e estimulá-las a retomar a vida, superando o trauma.

 

Caminhando Resiliência e resistência são conceitos próximos, mas há diferenças, pois a pessoa resiliente vai além da resistência… Além de suportar a pressão aprende com as dificuldades e os desafios, utiliza-os como feedback e usa sua flexibilidade para se adaptar e sua criatividade para encontrar soluções alternativas, novos caminhos.

Logo, mais uma vez, o que se segue são etapas a serem aprendidas e debatidas na supervisão, e cada caso clínico deve receber uma montagem mais adequada, como na metáfora do alfaiate como um homem sensato… Ele sempre mede e se orienta pelas medidas para fazer a roupa do cliente, cada pessoa tem medidas próprias, e às vezes, em épocas de Natal ou Páscoa, é preciso retomar as medidas… Ou fique longe do alfaiate!

Ilusão

 

Calorias

 

 

Segue o roteiro com comentários…

Coloque a pessoa em…

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  • Posição confortável, respirando normalmente.
  • Focalizar mais na respiração do cliente, sempre observando o comportamento não-verbal. Inspirar suavemente e expirar suavemente

1°) Inspirar pelo nariz – expirar pela boca, como se estivesse soprando a chama de uma vela, mas sem querer apagá-la. (15 vezes, mais ou menos)

2°) Inspirar e expirar pelo nariz (15 vezes, mais ou menos)

  • Inspirar – reter- expirar (15 vezes)
  • Se o estado não-verbal mostra que o relaxamento foi atingido, então se pode passar a outra etapa, eleger um estado mental de recurso para os objetivos que se pretende alcançar.
  • Uma vez no estado de recurso, cabe agora produzir âncoras cinestésicas de tal forma que o estado de consciência de recurso fique associado a um movimento corporal, ou seja, se pede ao cliente para intensificar ao máximo as sensações de recurso e fazer um movimento corporal simultâneo (alguns cerram os punhos, outros enrijecem o abdômen, etc).
  • Teste: este consiste em retirar o cliente dos estados, distrair ele um pouco, e em seguida pedir que faça o movimento e entre no estado de recurso. Quanto mais se treine este arco maior será a facilidade de entrar em um estado específico de recurso.

Krishnamurti

Explicando alguns detalhes e lembrando que um psicoterapeuta experiente tem muitos recursos e cada um destes itens poderia ser locupletado com muitas sugestões de técnicas.

 

1 – Posição confortável e foco na respiração do cliente.

Instruções para respirar normalmente, tranquilamente, saudavelmente e se permitir este momento de estar consigo próprio.

Obs. Se pode ter âncoras auditivas (música suave), olfativas (incensos), claro, sempre checando as preferências do cliente e a sua autorização. É muito importante, isto é básico, haver um bom relacionamento com o cliente, com os valores pertinentes, confiança, por exemplo. Outra emoção fundamental em psicoterapia é o uso do humor. E, um preceito, nunca ferir a dignidade do cliente.

 

Evangivaldo 2- Focalizar mais na respiração, sugestões para inspirar e expirar calmamente (voz suave, firme e se manter atento ao comportamento não verbal do cliente; o feedback não-verbal é o mais importante na psicoterapia, pois em comunicação, a mensagem tem 30% de peso verbal e 70% não-verbal, ou seja, se alguém diz que não está nervoso, ou com medo, ou preparado para enfrentar uma situação e seu comportamento não-verbal é incongruente, se deve dar atenção especial à esta incongruência.

 

 

 

lutaNo caso, calibrando e recalibrando o estado do cliente usando as técnicas mais variadas ao alcance do terapeuta, ou seja, estados disfuncionais, incongruentes ou de sofrimento, se não forem ser trabalhos devem ser afastados. O cliente  ao entrar em um destes estados de sofrimento fica preso a um complexo de imagens, sons e sensações, que cada vez mais alimentam sua percepção de incapacidade e impotência, gerando mais sofrimento, num ciclo crescente.

Exemplo.

Trabalhando com um cliente vítima de severos abusos sexuais  em sua infância, o coloquei no estado de relaxamento e recurso para começar a usar um protocolo da técnica denominada EMDR. O cliente entrou em seu Ashram (lugar de recurso), entretanto, ao acessar o material denominado “cena temida” (ou seja, as cenas do abuso), seu comportamento não-verbal mostrou um enorme sofrimento visceral e ele decidiu interromper o trabalho naquele dia, isto é fundamental, respeitar o limite do cliente.  Então, a questão naquele momento para o terapeuta era como tirar o cliente do estado emocional extremamente perturbado em que se encontrava, para o mesmo voltar para casa, onde morava sozinho.

A decisão inicial seria processar o material até o êxito da técnica, porém, tal decisão nunca deve ser unilateral, a terapia é sempre um compartilhar de decisões, sempre que possível.

Dia dos pais
Homenagem ao dia dos Pais

E ali estava o cliente sofrendo e se recusando a continuar naquele dia, detalhe que ele pontuou e permitia um entendimento do seguinte tipo: “olha, hoje não dá, me tire desta,  e faremos isto de uma próxima vez”. (Notem que o inconsciente sábio do cliente pode ter “armado” um problema inicial para o terapeuta, uma espécie de prova de competência: “mostre se você é capaz de lidar com isto, se assim for, eu terei segurança para fazer a cirurgia psíquica com você”.)

Cabia ao terapeuta louvar a máxima… “O cliente deve sair igual ou melhor do que entrou no consultório”… Mostrar sua competência em lidar com aquela situação era vital, principalmente, pelo bem estar e segurança do cliente.

Velório Então, eu usei uma metáfora forte, tão violenta quanto o fato de ter sido abusado ao longo de anos em sua infância. Tal metáfora era uma história de trauma de guerra de outro cliente. Este vira um amigo seu ter a cabeça arrancada por um petardo da artilharia contrária. Embora forte, a metáfora estabelecia um paralelo de sofrimento igualmente forte, atraindo a atenção do cliente para fora de si. Como sabem os terapeutas, o sofrimento psíquico é em grande parte função do imaginário. Os clientes ficam presos em estados emocionais impotentes, tais estados geram um complexo de imagens e sensações, muitas vezes sons e odores, que alimentam os quadros nosológicos, por assim dizer, descritos nos manuais de psiquiatria e nas obras taxionômicas, como os DSM (sigla em inglês para Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais)  e o CID (Código Internacional das Doenças).

Recuar estratégico

Feito isto, o cliente teve sua atenção focalizada no meio externo, isto é importante, o sofrimento ocorre e paralisa quando estamos associados, o paralelo fisiológico disto é uma atenção hiper concentrada em si mesmo ou no seu problema, o que no fundo é a mesma coisa. Tal padrão, em NLP, é chamado de associado, é uma submodalidade necessária para haver um grande sofrimento, ou medo, ou até  mesmo sensações positivas. Em um sonho, por exemplo, se estamos voando ou experimentando algo bom, realmente usufruímos como se estivéssemos na situação, repito, seja um pesadelo ou um lindo sonho.

 

 

Diabo verdePortanto, ao gerar uma poderosa metáfora de sofrimento proporcionalmente imensa a um abuso, com temas correlatos como a morte (muitas pessoas abusadas se sentem mortas, ou com partes “zumbis” – dissociadas da realidade), foi possível atrair a atenção do cliente e “puxá-lo” para fora de si, para ver o outro, daí, explicando sobre o processo do outro foi possível ele entender seu próprio processo. Isto exige também uma mudança fisiológica de foco, ao se colocar numa posição de prestar atenção em algo, se nutre um estado de solidariedade, ou pelo menos, compartilhamento. Também se ativa mais o córtex, diminuindo a supremacia do sistema límbico, ou de estados emocionais perturbadores.

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Luganus 2016

3 – Eleger um estado específico pode ser exemplificado através de uma palestra que proferi na área da psicologia do esporte. Dentre várias temáticas expus uma técnica de relaxamento. Durante o intervalo, um dos presentes, um presidente de um clube de futebol, me disse que haviam feito esta técnica no vestiário, mas em campo seu time havia sido arrasado pelo adversário. Sorri, e perguntei quem havia aplicado tal técnica, ele me disse.

Bem, eu fiquei numa sinuca, mas tinha que dizer a verdade, “o colega que aplicou tal técnica de relaxamento antes de um jogo, talvez não tenha tido tempo (tentei amenizar) de continuar e ancorar um estado de recurso condizente com a situação”, ou seja, se você vai enfrentar um adversário, ou estudar, você não pode ter um estado de recurso em que o sistema parassimpático fica mais preponderante, dito de outra forma, você não pode dormir se vai pilotar um carro, ou praticar um esporte que exige um estado alerta. Foi o que aconteceu em campo, os jogadores estavam “lentificados”.

diamante4- Tais âncoras, ou condicionamentos, permitem acessar mais rapidamente os estados de recurso, e se pode e deve treinar em casa. Incentivar os clientes a treinarem tais estados é fundamental, um tipo especial de âncora pode ser usado com a técnica de EMDR, ou seja, enquanto o cliente está no máximo de seu estado de recurso se pode estimular bilateralmente seu corpo, seja com toques alternados nos joelhos, ou ombros (é importante que o cliente se sente sem cruzar as pernas, tendo também os braços na paralela, isto é, sem tocar seus membros opostos). Podem-se usar também sons bilaterais, próximos dos ouvidos, sempre alternados, por exemplo, estalando os dedos. E, se pode pedir ao cliente, que mesmo de olhos fechados os movimente de um lado para o outro.  E, dependendo da habilidade do terapeuta, se pode fazer isto tudo ao mesmo tempo.

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Parque das Ruínas (Santa Teresa. Rio de Janeiro. Brasil)

 

levanta-sacode-a-poeira5 – No teste é, mais uma vez, de vital importância se prestar a atenção no comportamento não-verbal do cliente. Donde, se deve ter a habilidade de tirá-lo do estado de recurso, usando alguma distração casual, e observar se realmente seu estado se modificou (mas, atenção, nunca puxar o assunto da queixa dos sintomas, do sofrimento, ou da fobia, pânico, seja lá o que for, deixe isto para depois, para  o processo da psicoterapia, se for o caso).

Bem, uma vez feito isto, se pede ao sujeito para fazer o tal movimento corporal, por exemplo, cerrar  os punhos, e perceber se consegue ir mais rapidamente para o seu Ashram, estado de recurso interior.

Aloha

frase-1

bom-humor

Lixo no pátio. Haja zika ou aja, zika?!
Lixo no pátio. Haja zika ou aja, zika?!

 

Pai bruno

crise

 

 

 

 

 

 

greve e resiliência
Greve e resiliência

O inimigo interior

 

Energia

 

 

 

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Perspectiva

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Comoção

 

 

 

Lug (26)
Luganus dez 2015

 

Javali

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Paz, saúde e vida longa! Este texto é também uma homenagem aos meus amigos – irmãos, Osnoff, O Barão e a Baronesa e tantos outros!!!

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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calma
In memorian Adir Moisés Luiz

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Por Celso Lugão

Especializações em PSICOLOGIA CLÍNICA E HOSPITALAR. Exerce ATIVIDADE CLÍNICA fazem mais de 30 anos, tendo criado sua abordagem particular de PSICOTERAPIA ESTRATÉGICA. Possui MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL PELA FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS. Atualmente é professor do INSTITUTO DE PSICOLOGIA DA UERJ tendo criado o setor de PSICOTERAPIA ESTRATÉGICA NO SPA DA UERJ EM 1988 e desde então atua como SUPERVISOR desta abordagem. Participou de forma intensiva do PROCESSO DE VALIDAÇÃO DA HIPNOSE como TÉCNICA PASSÍVEL DE SER UTILIZADA PELO PSICÓLOGO, fato este reconhecido pela SOCIEDADE BRASILEIRA DE HIPNOSE e pela SOCIEDADE DE HIPNOSE E MEDICINA DO RIO DE JANEIRO. Possui experiência em várias áreas da psicologia, a saber: EPISTEMOLOGIA DAS PSICOTERAPIAS (DESENVOLVIMENTO DE REFERENCIAIS EPISTEMOLÓGICOS E CLÍNICOS; ESTUDO DAS PERSPECTIVAS ESTRATÉGICA, ESTRUTURAL E SISTÊMICA EM RELAÇÃO AO INDIVÍDUO E A FAMÍLIA) ; PSICOLOGIA CLÍNICA E HIPNOLOGIA (TRANSDUÇÃO DA INFORMAÇÃO MENTE-CORPO, PSICOIMUNOLOGIA, TÉCNICAS HIPNÓTICAS, CORPORAIS, PSICODRAMÁTICAS E ESTADOS ALTERADOS DA CONSCIÊNCIA); TANATOLOGIA (MORTE, LUTO E SEPARAÇÕES); PROCESSOS DISSOCIATIVOS (TRAUMA, DISTÚRBIO DISSOCIATIVO DA IDENTIDADE, SÍNDROME DO STRESS PÓS-TRAUMÁTICO, SÍNDROME DO PÂNICO, SUICÍDIO, DROGADICÇÃO, PSICOSES); E ASPECTOS PEDAGÓGICOS DA SUPERVISÃO (TREINAMENTO, INFORMAÇÃO E FORMAÇÃO ). (Text informed by the author)

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