Reflexões e orientações da psicologia clínica diante do momento atual Em 20/03/2020 by Prof. Celso Lugão da Veiga (supervisor em psicoterapia estratégica – IP- SPA- UERJ)

by Diogo Lean "A perspectiva do paciente"
“A perspectiva do paciente” by Diogo Lean Veiga

                                                                                                              

     Muitas questões que assolam o século XXI, como esta pandemia causada pelo vírus Covid -19, assim denominado por determinação da OMS¹,  evidentemente, são provenientes de processos históricos, psicossociais, econômicos e políticos que já eram passíveis de ser notados no século anterior.

Quanto as reflexões e orientações da psicologia clínica que aqui serão expostas, estas giram em torno do entendimento de que em quaisquer das inúmeras abordagens sistêmicas (psicanálise, behaviorismo, existencialismo e cognitivismo, para resumir) existem parâmetros e protocolos comuns, mesmo que com terminologias diferentes.

Algumas reflexões impressas em árvores…
Um tesouro que teme tesouras e água!

Alguns destes parâmetros se referem a acolhida do cliente, ao bom relacionamento com este (rapport), o que permite transmitir e gerar segurança diante do entendimento de sua situação (diagnóstico diferencial), e com isto sinalizar estratégias em prol de soluções saudáveis (o bom prognóstico).

Nos dias atuais, após os inúmeros congressos sobre a evolução da psicoterapia, se pode asseverar que a metáfora usada por M. H. Erickson sobre o trabalho terapêutico se aplica a todas as abordagens sistêmicas… Tal metáfora se refere ao entendimento de que o cliente, seja este um indíviduo, um casal, uma família, ou um grupo de pessoas, pode ser entendido como uma  planta em um solo… Portanto, ao se cuidar da planta se deve prestar atenção ao solo em que está; a qualidade,  nível, e a quantidade, grau, de seus nutrientes.

Embora se possa criar estratégias ou abordagens específicas para cada cliente diante de tal entendimento, não se pode menosprezar as influências do solo, e é justamente neste sentido que a psicologia social, a história e as demais áreas já citadas no primeiro parágrafo se fazem necessárias para uma compreensão abrangente dos reflexos do solo na planta.

Em um estudo sobre a relevância da “psicologia social frente ao poder e ao controle da destrutividade” ² foi possível se investigar sobre os armamentos, isto por volta da década de 80… Constatou-se que muitas ameaças pairavam no ar, desde as armas nucleares até as igualmente letais armas químicas e biológicas. A trinca de gases neurotóxicos, sarin, soman e tabun, assim como certos venenos e armas biológicas com poder devastador mostravam a necessidade de controle extremo sob pena de se promover um caos social sem precedentes.

Não se está com isto afirmando que houve uma intenção em se liberar um agente bélico biológico, mas sim que tais cenários já foram e são estudados, faz tempo, por inúmeras agências de pesquisa militares e conexas. Tendo gerado uma onda de filmes neste sentido, como “Epidemia”, “Fuga”, Dia dos mortos”, etc.

Dados sobre os armamentos e os filmes  podem ser encontrados num rápido passeio, hoje em dia,pelo Google, mas não é este o propósito aqui.

Mas, além de filmes produzidos na década de 90, todos devem lembrar do ato de terrorismo perpetrado por membros do culto apocalíptico chamado Aum Shinrikyo em 20 de março de 1995…Em cinco atentados coordenados, os autores liberaram o gás sarin em várias linhas de metrô de Tóquio, matando doze pessoas, ferindo gravemente cinquenta e mais ligeiramente 6.000 pessoas.

Então, retornando ao  entendimento anterior sobre protocolos- padrão em todas as formas de psicoterapia, seria importante um entendimento dos processos que ocorrem durante situações de stress, que H. Selye chamava de síndrome de adapatação geral.

Quando ocorre um estímulo, seja este qual for, o organismo entra em alerta (primeira fase). As funções da percepção (adaptação, defesa, vigilânica e predição) fazem o seu papel, observando que tipo de ação deve ser tomada. Se estamos estudando e começa a chover, prestamos atenção na chuva e somos informados por nossos sensores e por nossa mente que nada precisa ser feito, talvez apenas fechar uma janela, mas podemos continuar estudando. Na medida que a chuva continua ela passa para um segundo plano, ou seja, o foco está no estudo. Mas, para o foco estar no estudo precisaremos nos “desligar” do ruído da chuva. Tecnicamente, precisamos dissociar do estímulo. Porém, ele continua lá, o ruído da chuva.

 Então, se entra numa segunda fase da teorização de H. Selye sobre o stress, a fase de resistência… Para se entender o mecanismo por trás de síndromes como o “burnout” é preciso entender que embora você esteja estudando, você está resistindo ao ruído da chuva.

Para uma maior compreensão… Substitua o barulho da chuva por um panelaço ou pelo som altíssimo da festa no play abaixo de sua janela… Se você está estudando para uma prova naquela semana certamente irá perceber o tremendo cansaço proveniente de tentar manter o foco nos estudos, e logo chegará a uma terceira fase, a exaustão

Sons e etc

Nesta fase, em geral o organismo para, desistimos de estudar e verbalizamos isto… “Não aguento mais, estou exausto!”

Quando se insiste, por razões de personalidade  e/ou necessidade se pode chegar a uma quarta fase, a morte, a falência geral do organismo.

Luganus Capuz
Luganus e seu Ômega Capuz

Logo, diante das notícias sobre a pandemia e sobre tantos outros aspectos da vida³ temos que manter o foco, isto não signfica que não está havendo um desgaste proporcional aos estímulos que estamos suportando de forma dissociada. É como varrer a poeira para baixo do tapete, ela ficou em segundo plano mas está lá, produzindo contaminações, hormônios como cortisol.

O que fazer diante disto? A recomendação é se fortalecer, aquilo que se convencionou chamar de resiliência. A metodologia que aqui será exposta, para simplificar, é uma fusão de recursos provenientes da psicologia oriental e ocidental, uma fusão de técnicas das duas vertentes.

O tubarão concordou em participar da brincadeira pictórica

Resiliência é possuir energia para enfrentar crises, traumas, perdas, graves adversidades, transformações na vida (traições, separações), rupturas e desafios, elaborando as situações e recuperando-se para seguir em frente.

O termo é usado há mais de 30 anos pela psicologia, porém o conceito ganhou popularidade depois do ataque terrorista ao World Trade Center, nos EUA, em 11 de setembro de 2001.

Diogo e Rodrigo Water Men
Water men

Após a tragédia, o governo distribuiu cartilhas às pessoas envolvidas com o acidente para ensiná-las e estimulá-las a retomar a vida, superando o trauma.

Resiliência e resistência são conceitos próximos, mas há diferenças, pois a pessoa resiliente vai além da resistência… Além de suportar a pressão aprende com as dificuldades e os desafios, utiliza-os como feedback e usa sua flexibilidade para se adaptar e sua criatividade para encontrar soluções alternativas, novos caminhos.

Portanto, como o stress faz parte da vida, assim como a agressividade, e assim como esta se diferencia da destrutividade, o “distress” seria o mal stress e para lidar com ele alguns pontos são fundamentais…

Primeiro, se deve entender que as supra renais4 são as glândulas que recebem o impacto do stress, logo, beber muito líquido é sempre importante, de preferência água, água de coco, chás claros ou sucos coados. Tomou um susto, beba mais água.

Junto com este hábito saudável de ingerir água, a prática diária de exercícios, em particular do que se convencionou chamar de  exercícios de respiração para a coerência cardíaca deve fazer parte da rotina das pessoas.

Tais exercícios têm a função de aumentar o poder do sistema psiconeuroimunológico.

Exemplificando um deles. Inspire e faça uma contagem mental, isto será “x”.

Retenha 3x, assim se você contou 3, se x= 3, 3x=9.

E na expiração, você conta 2x, ou seja, seis.

Inspira, x, retém, 3x, e expira, 2x.

Faça isto três vezes seguidas, pela manhã. Ou sempre que precisar ou quiser.

Isto irá “alinhar” o teu sistema nervoso autônomo, o ortossimpático e o parassimpático, levando ao estado de coerência cardíaca, o que fortalece o teu sistema imunológico.

Maiores informações poderão ser obtidas no endereço eletrônico https://www.psicoterapiaestrategica.com.br/tecnica-de-formulacao-de-recursos/

O momento portanto, requer calma e fortalecimento do sistema imunológico e para se obter isto é fundamental dar atenção ao próprio corpo começando com as práticas de respiração, a alimentação saudável, muita ingestão de água, exercícios fisícos… Como dizia o monge Thich Nhat Hanh “Como tu amas a ti mesmo?… Em primeiro lugar, inspire! Com toda a tua mente e perceberás que tem um corpo.”

No link abaixo poderão assistir a palestra integralmente.

Uma mensagem fundamental.

                                                                                                                                      Em 20/03/2020

         Professor. Celso Lugão da Veiga (supervisor em psicoterapia estratégica – IP- SPA- UERJ)

Notas

¹ A Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou que o nome oficial da doença causada pelo novo coronavírus passará a ser Covid-19.

“Agora temos um nome para a doença e é Covid-19”, disse o chefe da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, a repórteres em Genebra.

 Segundo a OMS, a palavra coronavírus refere-se ao grupo de vírus ao qual pertence, e não à última cepa. O vírus em si foi designado como SARS-CoV-2 pelo Comitê Internacional de Taxonomia de Vírus. Os pesquisadores vêm clamando por um nome oficial para evitar confusão e estigmatização de qualquer grupo ou país.

“Tivemos que encontrar um nome que não se referisse a uma localização geográfica, um animal, um indivíduo ou grupo de pessoas, e que também seja pronunciável e relacionado à doença”, disse o chefe da OMS.

“Ter um nome é importante para impedir o uso de outros nomes que podem ser imprecisos ou estigmatizantes. Também nos fornece um padrão a ser usado em futuros surtos de coronavírus.”

O novo nome é retirado das palavras “corona”, “vírus” e “doença”, com 2019 representando o ano em que surgiu (o surto foi relatado à OMS em 31 de dezembro).

² Dissertação de mestrado do autor que pode ser achada na plataforma Lattes. Basicamente a destruvidade é um conceito de E. Fromm para separar a agressividade, que é inerente a vida.

“Observa-se uma dose de comportamento agressivo na maior parte dos animais, pois é essa a condição necessária para a sobrevivência. Seria implausível se pensar o ato de sobreviver sem se considerar a presença da agressividade para que o ciclo da vida continue. No entanto, é importante observar que essas relações sempre visam, em última instância, o equilíbrio do número de animais de cada espécie. Por isso, podem ser classificadas como situações agressivas naturais e não, violentas. Nas relações humanas parece ter havido uma espécie de metamorfose do instinto de agressividade. Essa transformação pode ser observada na negatividade que o conceito de agressividade ganhou. Uma pessoa chamada de agressiva na atualidade é quase que imediatamente comparada a alguém violento, destrutivo. A agressividade passou a ser concebida portanto como sinônimo de destrutividade. No entanto, torna-se pertinente frisar que a agressividade tem aspectos positivos no que tange à luta pela sobrevivência e também em situações nas quais é preciso defender-se de algo ou de alguém”.

 ³Recentemente as pessoas no Rio de Janeiro, tiveram o problema estadual da contaminação da  água, pela geosmina… Os problemas de segurança, do narco tráfico, das milícias, do sistema de saúde e de transporte. O rompimento de barragens. A ameaça de guerras que sempre gera tensões internacionais e pessoais, embora se varra para debaixo do tapete para se ir vivendo, mantendo o foco.

4 As glândulas supra renais têm vários papéis metabólicos no corpo humano. Nossas duas glândulas supra renais podem ser encontradas na parte superior de cada um dos nossos rins. Juntos, eles liberam os hormônios que nos ajudam a metabolizar, atuam na maturação sexual à medida que crescemos, além de responder ao estresse. Este último pode ser conhecido como a resposta primitiva de “luta ou fuga”. O hormônio chamado cortisol é a chave para coordenar os processos que nos permitem lutar ou fugir das ameaças.

Texto publicado na Segunda Edição do Boletim do Instituto de Psicologia da UERJ.

Por Celso Lugão

Especializações em PSICOLOGIA CLÍNICA E HOSPITALAR. Exerce ATIVIDADE CLÍNICA fazem mais de 30 anos, tendo criado sua abordagem particular de PSICOTERAPIA ESTRATÉGICA. Possui MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL PELA FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS. Atualmente é professor do INSTITUTO DE PSICOLOGIA DA UERJ tendo criado o setor de PSICOTERAPIA ESTRATÉGICA NO SPA DA UERJ EM 1988 e desde então atua como SUPERVISOR desta abordagem. Participou de forma intensiva do PROCESSO DE VALIDAÇÃO DA HIPNOSE como TÉCNICA PASSÍVEL DE SER UTILIZADA PELO PSICÓLOGO, fato este reconhecido pela SOCIEDADE BRASILEIRA DE HIPNOSE e pela SOCIEDADE DE HIPNOSE E MEDICINA DO RIO DE JANEIRO. Possui experiência em várias áreas da psicologia, a saber: EPISTEMOLOGIA DAS PSICOTERAPIAS (DESENVOLVIMENTO DE REFERENCIAIS EPISTEMOLÓGICOS E CLÍNICOS; ESTUDO DAS PERSPECTIVAS ESTRATÉGICA, ESTRUTURAL E SISTÊMICA EM RELAÇÃO AO INDIVÍDUO E A FAMÍLIA) ; PSICOLOGIA CLÍNICA E HIPNOLOGIA (TRANSDUÇÃO DA INFORMAÇÃO MENTE-CORPO, PSICOIMUNOLOGIA, TÉCNICAS HIPNÓTICAS, CORPORAIS, PSICODRAMÁTICAS E ESTADOS ALTERADOS DA CONSCIÊNCIA); TANATOLOGIA (MORTE, LUTO E SEPARAÇÕES); PROCESSOS DISSOCIATIVOS (TRAUMA, DISTÚRBIO DISSOCIATIVO DA IDENTIDADE, SÍNDROME DO STRESS PÓS-TRAUMÁTICO, SÍNDROME DO PÂNICO, SUICÍDIO, DROGADICÇÃO, PSICOSES); E ASPECTOS PEDAGÓGICOS DA SUPERVISÃO (TREINAMENTO, INFORMAÇÃO E FORMAÇÃO ). (Text informed by the author)

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